Este é um tema vinculado ao entendimento das doutrinas do Evangelho. Não é um tema relacionado ao movimento do cristianismo, em particular, a não ser sobre a ênfase no pecado para gerar o medo. A exploração que este fez do pecado, em proveito da sua subsistência, é o que vamos tratar aqui.
Pecado é o termo religioso que, secularmente, significa transgressão.
Transgressão significa quebra de uma lei, ou desobediência a uma lei.
Quando infringimos a lei de trânsito, estamos cometendo uma transgressão ao código de trânsito. Quando infringimos a Lei de Moisés, estamos cometendo uma transgressão à Lei de Moisés. Esta transgressão ou desobediência à Lei Mosaica foi chamada, na bíblia, de pecado e era considerada uma ação contra Deus.
Para que haja uma transgressão é necessário haver uma lei. Por conseguinte, se não houver uma lei, não existirá a quebra da lei.
Vamos falar um pouco sobre a Lei de Moisés que regeu o povo de Israel desde a sua saída do Egito, e de onde originou-se o termo pecado.
De Adão até Noé, existiram normas de conduta e procedimentos de adoração a Deus que, por obedece-los, fez Deus levar Enoque aos céus e salvou a Noé e sua família, do dilúvio. Estas normas de conduta e procedimentos de adoração foram introduzidas ao mundo pós dilúvio por Noé e sua descendência. Foram estas normas e procedimentos que culminaram na religião de Melquisedeque, o sacerdote do Deus Altíssimo, a quem Abraão pagou dízimos.
Abraão viveu antes da Lei de Moisés e, portanto, não cometia pecado por quebra da Lei. Havia, tacitamente, um código de ética e moral, normas de conduta entre os povos que viviam na sua época, de forma que regulasse os relacionamentos entre eles. A quebra desse código era uma transgressão ou desobediência, mas não era pecado religioso, ou pecado contra Deus.
Certamente, haviam, ainda, os procedimentos de adoração, porém não carregavam o status de lei de Deus, embora correspondessem ao relacionamento entre os homens e Deus. Como exemplo, temos na bíblia o costume de oferecer sacrifícios de sangue sobre um altar. Desde Adão este costume era praticado e Abraão, Isaque e Jacó o praticaram erigindo diversos altares de pedras ao Senhor para ali oferecerem os sacrifícios de bodes e ovelhas.
Observando esta prática, descrita na bíblia, tudo indica que não era costume, entre os povos, oferecer sacrifícios humanos. Porém, em todo sacrifício oferecido a Deus, deveria haver o derramamento de sangue.
O sangue representa a vida natural de todo ser vivente, humano ou animal, e o derramamento do seu sangue representa o total oferecimento daquela vida.
O sangue do animal era o substituto do sangue do homem, daquele que oferecia o sacrifício. O ofertante observava a agonia de morte do animal e a assimilava como sua própria agonia de morte. O sangue derramado do animal era reconhecido como sendo o seu próprio sangue. Sem a empatia com o animal o sacrifício não tinha validade.
Este procedimento de adoração a Deus era realizado toda vez que uma grande bênção era recebida, ou uma grande desobediência a Deus, seguida de arrependimento, era reconhecida pelo autor. Servia como um pacto selado entre o ofertante e Deus, desde que este se agradasse pela oferta. Portanto, o sacrifício no altar era um sinal de gratidão e de arrependimento.
Por intermédio de Moisés, uma Lei foi estabelecida para o povo de Israel. Ela representava a bênção e a maldição, determinadas por Deus, a todo aquele que a obedecesse e àquele que a desobedecesse. Quem a desobedecesse cometia pecado e sofria a punição estabelecida para o pecado. Quem a obedecesse recebia a justificação da parte de Deus e as bênçãos prometidas na Lei. Passaram a ser servos da Lei.
A Lei do povo de Israel era para ser o divisor entre Israel e os demais povos. Ela era o sinal do mais elevado senso de justiça que nenhum povo jamais teve. A justiça da Lei de Israel era reverenciada e odiada, assim como o Deus de Israel era reverenciado e odiado pelos demais povos.
Para o próprio povo de Israel, a Lei de Moisés foi a pedra de tropeço, pois este sempre acabava em desobediência e em desgraça. Israel era um povo obstinado, de coração endurecido e de dura cerviz (Ex 32:9; Dt 9:13; 1Sm 6:6; Ez 2:4). Ela lhe foi dada para a justificação do povo para com Deus, porém tornou-se o estandarte da sua rebeldia. Povos meneavam suas cabeças ao ouvir das desgraças que sobre vinham sobre Israel, desgraças que o seu próprio Deus tinha advertido que viriam, em consequência da sua transgressão.
Pela inobservância da Lei deu-se à luz ao pecado. Pelo pecado veio a desgraça, a ruína, a destruição e morte.
Deus, pelo pacto que fizera com Abraão, Isaque e Jacó, e pelo amor do Seu nome, suportou a rebeldia do povo de Israel. O próprio Israel cancelou, anulou o pacto que Deus houvera feito com ele e recebeu o justo juízo (Dt 31:16). Foi dominado, e levado de sua terra para uma terra distante. A cidade do rei foi destruída, o templo de Deus foi invadido, saqueado, queimado e destruído. Desgraça, fome e morte cobriram sombriamente sua terra.
O povo perdeu sua identidade, sua genealogia, sua religião, sua Lei e seu Deus. Ganhou a servidão, por setenta anos, até que o Senhor, por amor do seu nome, os trouxe de volta à sua terra. Buscaram reconstruir tudo, a partir de escombros.
A mão do Senhor tocou nos reis pagãos para lhes favorecerem, para que eles pudessem, mesmo com sofrimento, fome e dor, ter algum sucesso na reconstrução de Jerusalém.
A reconstrução do templo foi iniciada, porém já não havia mais a representação da presença de Deus, isto é, a arca do testemunho, a arca da aliança. Sem a arca, Deus se fazia ausente. A ausência da arca era a evidência de que Deus havia voltado a sua face e se afastado do povo de Israel. E assim foi sucedendo, em tempos difíceis, estando sempre sob domínio de povos pagãos, até a vinda do Messias Jesus.
Quando da vinda do Messias, Israel estava sob o domínio do Império Romano. Até então, o povo de Israel não havia entendido a razão da ausência do Senhor. Eles ainda não haviam entendido o seu pecado.
Clamavam pela vinda do Messias para que ele os libertasse do domínio gentio e instituísse o seu reino eterno. Porém, continuavam a ser um povo obstinado, de coração endurecido e de dura cerviz. O que Israel buscava não o alcançou, pois rejeitaram o Messias Jesus.
Dois mil anos se passaram e Israel continuou a sofrer a desgraça de seu pecado, continuando dominado por outros povos. Foi disperso pelas nações, perdeu sua língua original, sua identidade original, sua Lei original, sofreu perseguição, sofrimento, dor e morte. O Messias que eles esperavam, não chegou.
Lembremos que Israel anulou o pacto que tinha com Deus, ao quebrar a sua Lei reiteradas vezes, adorando outros deuses.
O Senhor estabeleceu um novo pacto com outro povo, aquele que recebeu e abraçou o Messias Jesus, como seu Deus. Neste novo pacto, nesta nova aliança, não houve uma lei estabelecida, apregoada, para ser executada nos moldes da Lei Mosaica. A lei do Senhor não estava mais escrita em rolos de pergaminho, ou em pedras, mas no coração daqueles que criam no Messias Jesus.
A graça, pela qual o Pai nos enviou o seu Filho Jesus, superabundou à Lei de Moisés. Não estávamos mais debaixo do pecado da Lei, mas da graça maravilhosa do Altíssimo. E a sua graça, manifestada no Evangelho de Seu Filho, foi e é suficiente para nos salvar.
Estar debaixo da graça significa estar livre das obras da Lei. Pela graça somos eleitos para ser filhos adotivos, enxertados na oliveira santa, pela fé no Filho de Deus, Jesus (Rm 11:17, 20).
A palavra de Deus agora está registrada nos corações, pela presença do Espírito de Cristo, e é professada pela boca de quem crê. É a palavra da fé e não mais obras da Lei. Quem assim crer com o coração e com a boca confessar, será salvo (Rm 10:10).
Logo, se estamos livres das obras da Lei, deixamos de ser servos da Lei e estamos livres do pecado, pois pela Lei vem o conhecimento do pecado. Porém esta liberdade do pecado que vem pela graça, nos torna servos de Deus, por nosso Senhor Jesus.
Neste novo concerto, como servos de Deus, estamos presos ao comprometimento de darmos frutos para santificação e, assim, alcançarmos a vida eterna (Rm 6:22-23). Esta servidão nos deixa livres da servidão da Lei, de procedimentos para fazer, pois não exige nada a ser feito em troca da sua recompensa, a saber, a vida eterna.
Um único requisito é suficiente e este é, crer, ter fé no Senhor. Crer no Senhor Jesus de todo o coração, e de todo o entendimento, e de toda a alma, e de todas as forças, sendo o teu Deus (Mc 12:33). Se assim crer nele, verá a glória de Deus (Jo 11:40).
Todos nós transgredimos quando estávamos no reino de Deus, e caímos, fomos destituídos da glória de Deus. Esta é a razão de estarmos neste mundo. Porém, pela graça de Deus e pela redenção que há no Senhor Jesus, por ter se dado em propiciação pela fé no seu sangue, a justiça de Deus foi cumprida na remissão de pecado que antes cometemos, sob a paciência de Deus. Logo, aquele que tem fé em Jesus, por Deus é justificado e não mais por obras da Lei (Rm 3: 23-26, 28).
Portanto, existe um único pecado debaixo da graça de Deus, a saber, a incredulidade, pois sem fé é impossível agradá-lo.
Entretanto, com fé, não existe pecado e nada será impossível (Mt 17:20; Mc 9:23; Hb 11:6).
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Depois deste banho teológico que Paulo nos apresenta, acho conveniente colocar em pensamentos que nos sejam mais claros.
Podemos concluir que quem reconhece e crê em Jesus sendo o Messias esperado por Israel, também o reconhece como Filho de Deus, nascido em carne. Da mesma forma, o reconhece e crê que ele é Deus entre nós, habitando o tabernáculo Jesus. Da mesma forma o reconhece como Senhor e Salvador, por meio de sua morte e ressurreição.
Portanto, se com a tua boca confessar ao Senhor Jesus – não por meio de um gesto público, na frente de uma plataforma religiosa, mas em todo o lugar em que a tua fé for requerida – e em teu coração crer que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Porque, com o coração se crê para a justiça, e com a boca se faz confissão para a salvação (Rm 10:9).
Sendo assim, o pecado sob o julgo da Lei, não mais existe e o estar debaixo da graça impera como um novo concerto, onde a fé no Senhor é que justifica perante Deus.
Uma vez justificado por Deus, o Filho nos recebe em si, para fazermos parte do seu corpo, nos enchendo do seu Espírito, e, como parte de seu ser santo, nos santificando.
Nada que possamos fazer vai nos dar o mérito para estarmos nele. Nada que possamos fazer vai nos garantir que ele nos receba em si. Tudo é por ele e para ele (Cl 1:16). Ele é quem avalia, ele é quem decide e é ele quem faz.
Tudo o que temos de fazer é amá-lo, ouvir suas palavras e nos colocarmos à sua disposição, com toda disposição de nosso coração para segui-lo em tudo o que ele fizer em nós e por meio de nós.
Esta é a única forma de honrar o seu nome, de adorá-lo, louvá-lo e glorifica-lo.
Indevidamente, o cristianismo se apoderou do conceito de pecado que vem da Lei de Moisés e incutiu no povo a ideia de que, se não cumprirem os mandamentos e ordenanças por ele determinados, eles estarão em pecado e necessitam da sua intermediação para que sejam perdoados.
O povo religioso passa a ser alienado aos seus líderes religiosos e aos mandamentos da sua religião. É necessário estar de bem com eles para que sintam que estão de bem com Deus (1Tm 2:5).
Portanto, ao se sujeitar à discrição da teologia do cristianismo, o povo passa a ser seu servo, dependente da sua “graça” que não é gratuita.
O autor e consumador da nossa fé ficou em segundo plano, já que todos tem de passar sob o crivo da religião.
O povo está com medo do pecado, em vez de temer a Deus. O povo está depositando sua fé na religião, em vez de buscar a fé do Filho de Deus.
Quem aceita o pecado dos mandamentos, da religião, está fora da graça de Deus.
Na verdade, o que o cristianismo apresenta para o povo é uma crença, uma história para se acreditar, que descarta a fé do Senhor Jesus.
A fé que vem da crença é uma fé na fonte errada, sujeita às instabilidades dessa fonte.
A fé que as religiões apregoam é uma fé ineficaz, pois é vinculada a, e dependente de, um apoio exterior, terreno.
Hoje, os crentes nominais dizem crer em Jesus, dizem ter fé em Jesus, ter fé em Deus, mas é uma fé inócua, sem frutos. Quando estão doentes ou necessitam de uma cura, procuram os médicos, os remédios e os recursos da medicina. Quando estão psicologicamente abalados, em depressão, com ansiedade, procuram por psicólogos. Quando necessitam do sustento básico, procuram a igreja ou a assistência social, ou a mendicância. Para todas as suas necessidades há um recurso terreno (1Co 11:30).
Onde hão há fé, reina o pecado, mas não o pecado da Lei; o pecado da incredulidade, da falta ou ausência de fé verdadeira. E onde há pecado, o mal está presente em todos os aspectos da vida das pessoas.
A doença física será sua companhia; desagradável, mas inseparável.
O desespero, a depressão, a ansiedade, o pânico, a demência, e todas as doenças mentais, psicológicas, estarão subjugando as pessoas, destruindo suas personalidades, destituindo-as de paz, de alegria, de razão para viver.
Desgraças, fatalidades, calamidades, morte, estarão enfurecidas, à porta, de prontidão para invadirem a tua vida.
Situações desagradáveis, indesejadas, ciladas e armadilhas estarão espalhadas pelo caminho.
Onde há pecado, onde há a ausência de Deus, o mal está sempre presente (Mt 7: 11; Ef 5:3-12).
O pecado é o mais elegante convite para o mal. Onde está o mal, o convite do pecado foi aceito.
Quem estiver fora da graça de Deus experimentará a presença do mal.
Não permita que o mal esteja presente na tua vida, meu irmão, caro leitor. Existe um convite mais sublime que o Senhor nos faz: ir a ele para que tenhamos vida (Jo 5:40).
Acorde (Ef 5:13-14)!
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